9 de julho de 2009

Duas poesias de Cristiano Melo

Poesias de *Cristiano Melo




A ESPERA


Espera-o ao lado da porta,

Enquanto não vem.



Espera-o com o fogo aceso

Do fogão à lenha,

Do seio em brasa.



Cheiros se confundem,

Enquanto não vem.



Os odores

Do sabão de coco,

Da colônia da venda,

Do frango caipira ao molho pardo,

Daquilo guardado.

Deseja-o ousado!



Gritam acolá

E a face rubra cora

Antes do beijo,Estupora!



Veio,

Foi!



Espera-o com panelas sujas,

Pratos engordurados,

Lençóis manchados,

E o filho no ventre.

Grávida,Enquanto não vem.







MARIA NINGUÉM


Tua alegria mudou Maria Ninguém

Por trás da membrana cinzenta de teus olhos,

Dos lábios de cor violácea, disformes,

E corpo emagrecido, com as salientes costelas.



A vida não te sorriu, Maria...

A sociedade te pariu e te desajuntou

Tua realidade é outra, das muitas fomes

A tua é sórdida com suave brilho de estrelas.



Para onde ir, não é Maria?

Aos braços de teu Zé Ninguém?

Para ele espancar tua alma com fórceps?

Enfiar pela tua goela a fumaça maldita?



Onde está o céu, deve ser uma questão,

Quase nunca ou sempre indagada em teu travesseiro.

Não é Maria? Mas mesmo a fome de teus filhos,

Não te aguçam a responder tais perguntas.



Está enferma Maria, muito doente!

E esta doença, é contagiosa e fatal.

Os ricos que te temem só sustentam teus males

E te deixam confusa com sorrisos de predador.



Shangrilá, Céu, Nirvana, Passárgada...

Paraísos fora de tua realidade, ó Maria,

Quais teus sonhos, tuas motivações?



Teu filho quer carinho, mas dá o pouco que tem

Ao Zé que te acorrenta e que devolve na mesma medida

As surras mútuas em teu mundo, Ninguém.



Tenho compaixão de ti e dos teus semelhantes,

Mesmo que tenha me sequestrado, furtado e espancado

Na minha alma maculado um furo.



Queria abraçá-la Maria, em meus braços te contar

Da vida que poderia ser diferente,

Dos sonhos que poderiam existir aos teus filhos.



Mas teu vício jocoso consome voraz

E só tem ouvidos aos Zes e Marias,

Nem a mim nem aos teus pequenos filhos,

Consegue te ater em qualquer atenção.



Talvez por saber de teu destino:

Mais uma cova rasa!

Jazigo das Marias Ninguéns.




* Nascido em Fortaleza-CE, em 31 de Março de 1973, onde fez faculdade de Odontologia na Universidade Federal do Ceará (UFC).
Reside em Brasília desde 1998, onde cursou especialização em Saúde Coletiva na Universidade de Brasília (UNB), e atualmente mestrado em Ciência da Informação na UNB. Possui interesses variados e entre eles a escrita, onde possui mais de duzentos poemas e prosas publicados em formato eletrônico em sites e blogs.
Escreve artigos científicos na área de educação, comunicação, informação e saúde, bem como capítulo de livros técnicos sobre a área de comunicação e informação em saúde.
Colaborador como revisor e editor da série Tempus da Editora do Departamento de Ciência da Informação e Documentação da UNB.
Mantém o blog
Braços Abertos.


* Cristiano Melo é um dos autores da II Coletânea Scriptus - A Livre Escrita




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3 comentários:

chica disse...

Que coisa mais boa de se ler! Adorei. A ´poesia da ESPERA, parecia estar lá. Lindo! abraços,chica

☆Lu Cavichioli disse...

Muito bom Cristiano!

Poemas cadenciados de ótima construção, permeados por conotações cotidianas e regionais.


Cristiano, venha para o Empório do Café Literário.
http://emporiodocafe.blogspot.com

Abraços
Lu C.

Cristiano Melo disse...

Obrigado Chica,
Alegra-me seu comentário e apreço.
abraços

Lu, obrigado pelo convite,
passarei lá sim,
seu comentário me alegra, normalmente não sou de temas regionais, mas gosto de misturar.
abraços

Cristiano